Por Bruno de Azevedo e Rafael Portugal
As Universidades Estaduais Baianas (UEBA), patrimônio de nosso povo, pedem socorro. A crise orçamentária que agrava a cada dia o serviço público baiano, aqui em especial as Universidades Públicas, vem atingindo de forma brutal as três categorias da comunidade acadêmica.
Grande parte do corpo estudantil das UEBA, oriundos da classe trabalhadora e excluídos historicamente do ensino superior, vem sendo afetados pelos cortes, contingenciamentos e pela falta de um programa estadual de assistência e permanência estudantil que atenda concretamente às necessidades de permanência.
Em 2022, a Lei de Cotas completa 10 anos de implementação. Os avanços garantidos, no que se refere ao acesso de grupos sociais historicamente excluídos das universidades brasileiras, são inegáveis. Contudo, é fato que, para além do acesso à universidade pública, é preciso garantir também a permanência.
Dentre as diversas políticas de permanência a serem garantidas nas universidades, encontram-se aquelas voltadas para a alimentação, moradia e transporte, por exemplo. Tais políticas refletem-se, respectivamente, em restaurantes universitários acessíveis, residências universitárias, transporte gratuito e creches para garantir a permanência de mães e pais estudantes.
Na contramão disso, o Governo da Bahia, de Rui Costa (PT), que em 2015 aprovou de forma autoritária o Programa de Permanência Estudantil (PPE), além de centralizar as políticas de acesso e permanência na capital, tirando autonomia das UEBA, implementou um programa extremamente precarizado, meritocrático e que não compreende as especificidades das estaduais.
Nesse contexto, um dos principais problemas da permanência estudantil encontra-se na precarização dos Restaurantes Universitários (RUs). Tal problema afeta em diferentes níveis as quatro UEBA. A UNEB, que conta com 24 campi espalhados pelo estado, só tem RU no campus de Salvador. UEFS e UESC, apesar dos avanços, contam com diversos problemas.
A UESB, por sua vez, conta com RU em seus três campi, porém, todos com graves problemas de funcionamento. Em Conquista, especificamente, o RU nasce já de forma conturbada. Concluído em 2005, o Restaurante enfrentou grande atraso nas obras e, quando da inauguração, esta se deu com extrema violência, inclusive com presença da PM, haja vista que os estudantes do período protestaram contra os preços abusivos impostos pela Reitoria, à época, comandada pelo Professor Abel Rebouças.
Desde então, a situação do RU da UESB nunca foi estável. Os problemas vão desde a falta de funcionamento efetivo, passando pela má qualidade das refeições, altos preços e um mau atendimento. Recorrentes são os casos de intoxicação alimentar. Em 2017, por exemplo, 16 alunos passaram mal após almoçarem no RU¹. No período, chegou a circular um vídeo em que aparecia larva na comida. Em 2020, já com outra empresa na gestão (a atual), outro caso de intoxicação foi registrado e cerca de 41 pessoas notificaram o Diretório Central dos Estudantes (DCE) sobre mal estar após comer no RU².
Recentemente, novas denúncias: desde comida crua até presença de cabelo nos pratos, chegaram ao conhecimento público. Ao mesmo tempo, a direção da UESB surpreendeu a todos com o anúncio de ajuste nos valores das refeições em favor da empresa concessionária. Tal situação foi amenizada após protestos dos estudantes com mobilização de CAs e DCE para evitar que o aumento ocorresse.
Além disso, foi pautado pelo Movimento Estudantil da UESB a suspensão imediata do contrato com a empresa concessionária, tendo em vista que esta continuou a descumprir, mesmo após notificações, os termos estabelecidos no contrato junto à Universidade.
Após intensas discussões e mobilizações estudantis, no dia 15 de setembro de 2022, a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas, Permanência e Assistência Estudantil da UESB (PROAPA) emitiu um informativo sobre a suspensão de contrato com a empresa gestora do RU, compreendendo o péssimo serviço prestado por esta. Após a saída efetiva da atual empresa, um serviço emergencial será implementado até que uma nova licitação seja realizada.
A grande questão que se coloca, agora, é pensar qual o modelo de RU melhor atenderá os e as estudantes da UESB. Primeiro, faz-se necessário que as mobilizações continuem em torno da garantia de um restaurante minimamente digno para categoria estudantil. Segundo, seja com empresa A ou B, sabe-se que o verdadeiro impeditivo para um RU de qualidade encontra-se na lógica privatista do serviço público, que terceiriza setores essenciais para empresas que têm como único objetivo o lucro.
Para atacar essa lógica, porém, é preciso pautar um outro modelo de assistência e permanência estudantil, bem como um outro modelo de universidade. É preciso pensar em uma universidade pública e em um programa de assistência e permanência que tenham compromisso com as necessidades materiais de estudantes e trabalhadores, e não com setores da burguesia que se utilizam de recursos públicos para se manterem no falso jogo da “livre concorrência”.
É justamente da lógica das privatizações, que paira nas universidades, que advém às problemáticas apontadas acima. Na Bahia, os Restaurantes Universitários estão todos nas mãos de empresas privadas, que prestam um serviço precarizado.
A terceirização, além de ser um retrocesso, ao colocar os trabalhadores contratados pelas empresas a prestarem um serviço precário, é também problemática pois nega ao conjunto dos estudantes a função básica do RU: garantir a permanência dos estudantes nas universidades. O que não vem acontecendo, uma vez que ao terceirizar o serviço, o lucro toma o lugar da permanência.
Por fim, entendemos que para estudar com saúde e segurança alimentar, é preciso pautar um Restaurante Universitário Popular, que perpassa mais do que nunca pela construção de um novo modelo de universidade, que atenda de fato as necessidades concretas de nossa classe, um RU que tenha em seu fim a permanência estudantil e não o lucro.
[1] Alunos da Uesb denunciam intoxicação no RU; vídeo mostra larva em comida: https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/alunos-da-uesb-denunciam-intoxicacao-no-ru-video-mostra-larva-em-comida/
[2] Estudantes da Uesb denunciam intoxicação alimentar após alimentação no Restaurante Universitário: https://adusb.org.br/web/page?slug=news&id=10294&pslug