Assistência e permanência estudantil na Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Depois de dois anos de pandemia do COVID-19, o ano de 2022 marcou a volta às aulas presenciais em todo o país e um Ensino Remoto Emergencial (ERE) precarizado e retrógrado. Além disso, foi um ano de extremo acirramento dos estudantes contra as políticas de cortes orçamentários e precarização nas políticas de assistência e permanência estudantil.

A Universidade Federal da Bahia (UFBA) passa por um momento extremamente crítico em relação às suas políticas de Assistência. A maneira como vem sendo conduzida a permanência de seus quase 40.000 estudantes é calamitosa e insatisfatória, colocando em risco a existência da maioria da categoria estudantil no espaço universitário.

Os bloqueios orçamentários destinados ao ensino superior brasileiro, sendo o último um bloqueio de R$344 milhões, feito em dezembro de 2022 pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, impedem o funcionamento pleno das universidades federais de todo país, afetando desde o pagamento de despesas básicas dos campi até o pagamento dos auxílios e bolsas das instituições.

Cabe ressaltar que as Universidades Públicas se encontram em grave crise e toda comunidade acadêmica vem sentindo as mazelas dos golpes sofridos na educação pública. A crise orçamentária atinge sobretudo, os estudantes, filhos da classe trabalhadora brasileira, numa tentativa incessante de exclusão destes ao ensino superior e à educação gratuita e de qualidade.

Cenário comum também nas UEBAS, que no ano de 2022 encontraram os mais diversos problemas relacionados à assistência estudantil, desde o pagamento de benefícios concedidos pelo estado, como também o mal funcionamento de seus restaurantes universitários, quando presentes em seus campis, e das moradias estudantis.

Como na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), que terminou o ano letivo de 2022 sem abertura do restaurante universitário do Campus I, mesmo que esse tenha sido inaugurado em dezembro de 2021, pela gestão do ex-reitor José Bites, levando os estudantes da universidade a organizarem plenárias e mobilizações pela abertura imediata do RU, pautando a gratuidade no serviço para cotistas, bolsistas e pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica, denunciando o valor absurdo proposto pela reitoria de R$16 por refeição. O ano letivo de 2022 na UNEB, se encerrou também com mobilizações estudantis no Campus II, em Alagoinhas, denunciando a precariedade das moradias estudantis e exigindo melhorias e reformas na casa dos estudantes.

Na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), os estudantes, em 2022, denunciaram a construção do “burguesão”, um restaurante privado self-service exclusivo para professores e servidores, custeada pela própria universidade, enquanto o restaurante universitário utilizado pelos alunos é alvo diariamente de reclamação de estudantes, pelas filas enormes e má qualidade da comida. A existência do “burguesão” é um retrocesso de uma década na luta por permanência e assistência estudantil e escancara a segregação dentro da universidade instituída por sua administração central, separando os estudantes das demais categorias que compõem a UEFS.

É essencial que os estudantes tenham suas necessidades concretamente atendidas, de maneira que se torne possível manter-se vivo e apto a lidar com as demandas criadas por uma instituição de ensino superior. Uma vez que as principais políticas de permanência não são cumpridas ou efetivamente ofertadas, a permanência dos estudantes na Universidade fica comprometida e ameaçada.

No contexto da Universidade Federal da Bahia (UFBA), o ano de 2022 refletiu um descaso na execução e no cumprimento de políticas essenciais de assistência e permanência. Com todas as dificuldades encontradas em um retorno presencial pós pandemia, o que agravou e dificultou ainda mais o ano letivo para os estudantes foi a péssima prestação dos serviços básicos de assistência. Moradia, alimentação e transporte não foram, e não são garantidos com a qualidade mínima aceitável, uma vez que são pilares para a existência digna no espaço acadêmico.

Em relação aos Restaurantes Universitários dos campi, a precarização do serviço prestado pela Universidade Federal da Bahia pode ser considerada hoje um dos problemas mais graves a serem enfrentados na Instituição pelos estudantes. Contudo, a pauta não é tratada com a devida urgência pela sua Administração.

Atualmente, nenhum restaurante universitário ou ponto de distribuição funciona na Universidade. A UFBA, que conta com um restaurante universitário e dois pontos de distribuição em Salvador, depois de semestres conturbados e caóticos com a prestação desse serviço durante a pandemia, inicia o ano de 2023 sem previsão de retorno e inclusive, sem contratos com empresas possibilitadas de ofertar refeições1. Essa situação é desesperadora para os estudantes, que faltando dois meses para o início do semestre letivo, não veem horizonte para reabertura de seus restaurantes, e retrata o cenário extenso de problemas com tal política de assistência, que há meses seu funcionamento ou não existiu, ou existiu de maneira extremamente deficitária.

Durante um período do último semestre de 2022, ainda com os contratos vigentes, os estudantes contaram com apenas dois pontos de distribuição, onde disponibiliza-se 250 porções no almoço e 100 no jantar, no ponto de distribuição de São Lázaro, e 180 refeições no almoço e 130 no jantar para o ponto de distribuição do Corredor da Vitória, para servir toda uma comunidade estudantil e trabalhadora que frequenta tais campi de Salvador2. Esse é um cenário de extrema precarização das políticas de assistência e que se mostrou insuficiente quase que diariamente diante do número de pessoas que compõem a comunidade acadêmica da UFBA.

Além disso, a categoria estudantil enfrentou durante todo período de 2022 uma falta de transparência gigantesca na divulgação das informações relacionadas às decisões tomadas pelo corpo administrativo da Universidade em relação às mesmas. Essa é uma problemática que se mantém. Hoje, em um contexto de não-funcionamento dos restaurantes, tem-se um processo de reabertura pouco divulgado, com as empresas consultadas que não são citadas nas notas da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil (PROAE), bem como um baixo fluxo de comunicação e informações prestadas à comunidade acadêmica.

É sintomático para uma instituição que se diz popular e inclusiva que esse descaso ocorra, pois é uma pauta que atinge a rotina do corpo estudantil e dos trabalhadores da Universidade de maneira completa e que em um contexto de tamanha gravidade como esse, precisa ser resolvido às claras, tendo um processo divulgado de maneira massiva e tratado em caráter emergencial.

Para além dos grandes períodos sem oferta de refeições, houve casos graves de intoxicação de pessoas que se alimentaram com a comida distribuída pelos restaurantes universitários. Consequentemente acarretou muitas queixas acerca da qualidade da comida distribuída. Houve casos de fios de cabelo e até um parafuso encontrados nas porções recebidas pelos estudantes nos restaurantes, o que é uma ameaça direta à vida de todas as pessoas que utilizam o serviço de alimentação, tanto no almoço quanto no jantar.

A suspensão atual do serviço de distribuição ocorreu em setembro de 2022, após um episódio como esse, sendo o mais grave acontecido na Universidade. A comida servida em um dos restaurantes universitários da instituição tinha presença de micro-organismos patogênicos, o que acarretou em mais de 18 casos de intoxicação de estudantes que buscaram atendimento médico, de acordo com informações dadas pela PROAE3. A gravidade dos casos foi tamanha que uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) foi necessária para atender os estudantes e funcionários afetados, o que foi confirmado em nota da Secretaria Municipal de Saúde de Salvador.

Desde o ocorrido, o distrato dos contratos com as empresas que produziam a comida dos restaurantes foi feito, após cobrança intensa do Movimento Estudantil para que isso ocorresse. As pautas levantadas pelos estudantes eram de maior transparência no trato da política de assistência estudantil, em especial ao que se refere aos restaurantes universitários, visto que a complexidade do caso exige um entendimento total do que está ocorrendo pela comunidade estudantil, que se encontra desinformada acerca dos avanços nas negociações que a UFBA afirma fazer nesses últimos meses.

As mobilizações estudantis na UFBA pautaram também a emergência na reabertura dos restaurantes e seus pontos de distribuição, reforçando que é impensável vislumbrar um retorno às aulas sem um pleno funcionamento na oferta de refeições garantidas pela Instituição.

Por fim, nas diversas atividades realizadas pelo Movimento Estudantil, levantou-se para administração central a crítica à terceirização da gestão dos Restaurantes Universitários. A lógica terceirizada impedirá sempre um funcionamento pleno e digno, tanto para os estudantes quanto para os funcionários, uma vez que as empresas estão visando o lucro na prestação de um serviço público e assistencialista para uma comunidade. Para além disso, o funcionamento privatista impede o controle e o acompanhamento das condições básicas que garantem um serviço digno, pois fogem do controle da Instituição a qualidade dos insumos, bem como as práticas de segurança no preparo e distribuição das refeições, por exemplo.

A volta às aulas de 2023, na UFBA, deve ser marcada por mobilizações massivas de toda a comunidade estudantil para garantir o pleno funcionamento de suas políticas de assistência e permanência estudantil. As pautas na ordem do dia devem ser: a extinção do serviço terceirizado na gestão dos restaurantes; ampliação do seu horário de funcionamento e construção de espaços adequados para abrigar aqueles que utilizam o serviço, evitando filas enormes como ocorreram em todo o ano de 2022, e que caso venham a ocorrer, os estudantes tenham um local adequado para se proteger do sol e chuva enquanto aguardam; abertura imediata do ponto de distribuição do Canela e reforma dos demais; funcionamento em três turnos, fornecendo também café da manhã, em contrapartida ao que ocorria antigamente, com um serviço oferecendo apenas almoço e jantar, com alimentos livres de agrotóxicos, produzidos e fornecidos pela agricultura familiar e pequenos produtores; e que todo o processo de administração seja transparente, amplamente divulgado e de conhecimento de toda comunidade estudantil.

1 Informação publicada pela PROAE em Comunicado n° 54/2022

2 Comunicado n° 38/2022

3 Comunicado n° 49/2022

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