A Escola Ideal Não Pode Ficar Apenas na Ideia: A Greve dos Servidores da Educação Municipal se Mantém e é Necessária

Por: CFCAM – Salvador

 

Entrei numa escola que era linda, quase perfeita: ideal. A escola ideal tinha salas amplas, centros de aprendizagem distintos e muitas cores. A escola ideal possuía uma cozinha coletiva para aulas e para o momento do lanche. Na escola ideal havia laboratório de artes, de ciências e de poesia. Na escola ideal os professores davam aula em um turno, e no outro turno planejavam. Planejavam com tempo, leveza e aprofundamento. Na escola ideal, todos os alunos chegavam com transporte escolar público e de qualidade. Na escola ideal, uma nutricionista planejava o cardápio semanal, que era executado por uma chef de cozinha, exceto nos dias em que as próprias crianças eram responsáveis pela feitura dos alimentos. Na escola ideal existe um grêmio estudantil e todas as decisões são também acompanhadas e discutidas com os estudantes. Havia mais elementos nessa escola, muito mais, mas precisei acordar antes que pudesse dar conta de todos eles.

A rede municipal de educação de Salvador está em greve. E esse texto poderia parar aqui, visto que, tanto eu quanto você, sabemos que nesse mundo capitalista em que educação é mercadoria, não existe a escola ideal. Contudo, há o que ser feito: o trabalho nas fissuras que as professoras* têm feito até o momento da escrita deste texto tem sido de nove dias de luta.

A rede municipal de Salvador luta por melhores estruturas físicas nas escolas, uma vez que estas não possuem bibliotecas, espaço de recreação, quadras para educação física, salas de danças e rede de internet. Além disso, o espaço interno das salas de aulas é muito pequeno. Os elementos aqui mencionados deveriam ser o mínimo, não é? Mas acho que o executivo municipal discorda.

Luta-se por auxiliares de desenvolvimento infantil – ADI nas salas de aulas de crianças pequenas – professoras e alunos precisam de apoio extra para que o momento da aprendizagem seja o mais prazeroso e feliz. Tudo isso é impossível de acontecer com apenas um profissional em uma sala com mais de 20 crianças, por exemplo.

Luta-se por merenda escolar de qualidade – Biscoito de leite e café não são suficientes para a criança que já falou na sala, antes mesmo das 9 da manhã, que está com fome. Em datas especiais e comemorativas, como o dia das crianças, por exemplo, o cachorro quente e a pipoca ofertados vêm de uma vaquinha angariada pelas professoras.

Luta-se para iniciar o ano letivo. Há escolas na rede municipal de Salvador que, até a presente data, não começaram as aulas. O motivo: a escola está em reforma. Após dois anos de pandemia o governo continua a submeter centenas de alunos à falta de aulas. E, no caso das escolas que já retomaram as atividades após as reformas, nos deparamos com espaços sem acabamento, com rachaduras ou infiltrações, e, ao menor sinal de chuva, alagamentos. Em algumas destas escolas, que apenas recentemente retomaram as atividades presenciais devido ao longo tempo empreendido em tais modificações físicas, seus profissionais se veêm frente à difícil escolha de aderir à greve por condições mínimas de trabalho, ou deixar de atender a comunidade escolar que tanto esperou pelo retorno das aulas.

Por fim, a nossa rede luta pelo reajuste salarial: com salários defasados há anos, às professoras foi oferecido um acréscimo de míseros 6%, mesmo com a lei garantindo um mínimo, que para ser atingido, necessitaria de um reajuste de 33, 24%. Como se tudo isso já não fosse suficiente, embora o salário base de uma professora de 40h da rede seja de R$ 2485,36, o prefeito de Salvador afirmou em suas redes sociais que estas recebem de 8.000 a 18.000 reais por mês!

A escola ideal pode ainda ser um sonho, mas é na luta diária que cada pedaço desse sonho se constrói em coletivo, para que ele se torne cada vez mais real.

Acompanhe aqui o calendário de greve e junte-se a nós na luta por uma rede de ensino básico pública e de qualidade para todas as pessoas.

*Escolhemos aqui generalizar “as professoras” por serem maioria nas salas de aulas de todo país e principalmente na rede municipal onde estão as salas de educação infantil. Quando vir essa grafia, compreenda “pessoas que trabalham na escola ensinando”.

Sair da versão mobile