Por Ricardo Costa (Rico)
Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, nasceu no Rio de Janeiro, em 1936, e foi um dos principais nomes da dramaturgia brasileira, apesar de ter morrido muito jovem, em 16 de julho de 1974, aos 38 anos, de câncer. Militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), foi dramaturgo, ator, roteirista de TV e influente ativista do mundo da cultura. Vianinha nasceu, cresceu, formou-se e tornou-se adulto em uma família de militantes comunistas, como eram seus pais, o dramaturgo Oduvaldo Vianna e Deocélia Vianna.
Foi destacado integrante do Comitê Cultural do PCB, que atuou no interior do mais importante aparelho privado de hegemonia diretamente influenciado pelo Partido no período, o CPC da UNE, cuja luta por uma cultura nacional-popular casava-se com a estratégia da revolução nacional democrática. Do CPC fizeram parte nomes que, mais tarde, despontariam como figuras de grande expressão na cultura brasileira: além de Oduvaldo Vianna Filho, Ferreira Gullar, Gianfrancesco Guarnieri, Paulo Pontes, Arnaldo Jabor, Carlos Diegues, Carlos Nélson Coutinho, Leon Hirszman, Carlos Estevam Martins, José Carlos Capinam, dentre os quais Vianinha destacava-se como “a grande cabeça” ou “a alma” dos movimentos liderados pelo CPC, conforme depoimentos daqueles que com ele conviveram.
Vianinha foi também um dos líderes do Teatro de Arena de São Paulo, criado em 1953 com o intuito de propor uma renovação e a nacionalização dos espetáculos teatrais, tendo assumido, no início da década de 1960, com Augusto Boal, Guarnieri e Vianinha, uma perspectiva cada vez mais crítica e revolucionária. Vianinha estudou arquitetura até o terceiro ano e depois abandonou o curso para se dedicar ao teatro. Começou em 1955, no Teatro Paulista do Estudante, atuando em vários espetáculos. Preocupado em criar uma dramaturgia vinculada aos problemas nacionais, promoveu o Seminário de Dramaturgia, visando a descoberta de novos talentos e a criação de textos vinculados à realidade brasileira.
Vianinha: um guerreiro da cultura
Nenhum outro autor teatral brasileiro recebeu tantos prêmios por suas peças, a maioria das quais proibida pela ditadura, dentre elas a obra–prima Rasga Coração, que é dedicada por ele “à velha guarda comunista”, como uma homenagem pelas lições de coragem e combatividade em defesa das liberdades democráticas e do socialismo. Visando levar a arte diretamente à população, criou um elenco para percorrer, com sua peça A Mais Valia Vai Acabar Seu Edgar, escolas, favelas, sindicatos da cidade e do campo e organizações de bairro.
Em sua trajetória de artista do povo ganhou vários prêmios nacionais e internacionais, como Quartos Quadras de Terra, que recebeu o primeiro prêmio latino-americano da Casa das Américas, em Havana. Ganhou dois Moliéres, com as peças Se Correr o Bicho Pega, Se Ficar o Bicho Come e A Longa Noite de Cristal, além de outros prêmios em São Paulo e do Serviço Nacional de Dramaturgia. Vianinha também atuou no cinema, em Cinco Vezes Favela, de Cacá Diegues, e fez teledramas de agitação e teleteatro para uma comunicação rápida e direta com o público.
Em 1973 foi para a TV Globo, onde escreveu, em parceria com outros dois dramaturgos e militantes do PCB, Paulo Pontes e Armando Costa, o premiadíssimo seriado A Grande Família. Com rara habilidade para driblar as censuras policial e empresarial, essa comédia de costumes, protagonizada por uma família de classe média remediada, expunha as dificuldades enfrentadas pela população durante os anos de chumbo. Vianinha conseguiu atrair audiência de massa com um seriado que sutilmente criticava a política econômica antissocial vigente, bem como a mentalidade reacionária e repressiva do regime militar.
Mesmo assim, por suas posições políticas, foi duramente censurado pelo regime militar. A maior parte de suas obras não puderam ser exibidas a partir de 1964 porque estavam proibidas pela censura. Vianinha morreu aos 38 anos sem ver encenadas suas duas obras primas: Papa Highirte, escrita em 1968 e só montada onze anos depois, e a clássica Rasga Coração, cujos últimos diálogos foram ditados no leito da morte, e também só encenada muitos anos depois.
Como afirmou o escritor Dênis de Moraes, autor do livro Vianinha, Cúmplice da Paixão, a definitiva biografia de Oduvaldo Viana Filho:
“Vianinha, em apenas 38 anos, viveu pelo menos 100, tamanha a intensidade de seu envolvimento com suas crenças e com a exigência crucial de tentar transpô-las para fora de si, através do teatro e da arte, o que implicou um esforço descomunal para superar as contingências cotidianas e as barreiras impostas pelas circunstâncias dos contextos em que viveu, sobretudo durante a ditadura militar. Esse esforço o tornou um homem múltiplo e mesmo multimídia (fez teatro, televisão, cinema, jornalismo, teoria crítica da cultura), ao mesmo tempo em que era um militante comunista em tempo integral, no setor cultural. Tudo confluía para o ponto chave: fazer política, lutar sem trégua pelas causas democráticas, socialistas e humanistas, explorando todos os espaços possíveis na batalha das ideias.”
Fontes:
https://fdinarcoreis.org.br/2013/09/23/vianinha-um-guerreiro-da-cultura/#more-525
https://fdinarcoreis.org.br/2012/07/04/muito-mais-que-a- -grande-familia/
https://pcb.org.br/portal2/6464
COSTA, Ricardo – Descaminhos da Revolução Brasileira: o PCB e a construção da estratégia nacional-democrática
(1958-1964), disponível em https://www.historia.uff.br/stricto/teses/Tese-2005_Ricardo_da_Gama_Rosa_Costa-S.pdf
RIDENTI, Marcelo – Em Busca do Povo Brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV, Rio de Janeiro, Editora Record, 2000