Rui Costa, um governo da ordem do capital

Por Milton Pinheiro

Estamos no sétimo ano do governo de Rui Costa, após 08 anos do governo do atual senador Jacques Wagner. Trata-se de uma longeva presença do PT e sua coalizão no comando político do estado. A forma política enfim encontrada por essas gestões subsumiu, desde os primeiros momentos, à lógica da ordem do capital nos mais diversos sentidos: político, com o Estado sendo o instrumento de conquista de novos aliados; econômico, com o tesouro estadual operando os interesses das frações da burguesia interna no bloco do poder; ideológico, com um discurso que passa sempre pela coisificação de deus na resolução dos “problemas” gerais, por uma defesa da família tradicional como forma de educação pública, por uma política pública que afirma a defesa da polícia justiceira, reafirma a educação militar na rede básica estadual e se posiciona a partir de uma visão de justiça que tem um caráter punitivista.

A ação política de Rui Costa mostrou-se muito eficiente, desde os tempos do governo Wagner, com capacidade de cooptar os negociantes da política em nosso estado que advém do “carlismo” e das diversas especificidades do “centrão” local. Hoje, pode-se afirmar que tem mais políticos do antigo clientelismo “carlista” com Rui Costa do que com o herdeiro do espólio de ACM, o Neto. Todo esse processo de cooptação mantém-se na ordem das antigas relações políticas: contabilidade eleitoral, densidade local, menor índice de conflitos internos no balcão do provincianismo político e fidelidade ao projeto eleitoral do Palácio de Ondina.

A novidade nessa lógica do sistema de cooptação é que, ao contrário do ex-governador ACM, Rui Costa permite que deputados federais, aliados na província, tenham “liberdade” para negociar seus votos no parlamento com o governo Bolsonaro. Assim, portanto, Rui Costa tem aliados na política estadual que são bolsonaristas no plano nacional. Citarei apenas dois casos emblemáticos: os deputados José Rocha e Cláudio Cajado, vice-líderes de Bolsonaro na Câmara Federal. Essa forma de aliança política, desigual e combinada, chama a atenção para a centralidade político-ideológica do que interessa ou não ao governador. Qual é então a relação do Sr. Rui Costa com pautas regressivas do governo bolsonarista? Eis uma questão muito importante nesse momento.

A opção por um Estado com modelo gerencial privado tem permitido ao governador apoiar diversas pautas das frações da burguesia interna que são operadas pelo governo Bolsonaro. Ataques sem precedentes aos serviços públicos e em especial aos funcionários públicos, o melhor exemplo dessa lógica é a leitura que o governador faz da PEC 32 (contrarreforma administrativa), onde ele afirma que o funcionário público deveria ganhar pelo que produzisse. O sistema público, na compreensão do governador da Bahia, integrante do PT, está sendo colocado na linha de montagem das empresas privadas.

Do ponto de vista econômico, a lógica imposta por Rui Costa (operada pelo Paulo Guedes Local, Manoel Vitório), é de farta dotação orçamentária para setores poderosos da economia baiana na rubrica de incentivos fiscais; concentra-se em um plano de obras, que nem sempre tem o devido corpo de funcionários para o atendimento ao público, e com forte apelo na propaganda oficial; um conjunto de reformas administrativas e previdenciárias que reforçam o bloco da privatização do Estado no Brasil, além de descabidos cortes e contingenciamentos de recursos nas áreas fundamentais da presença do Estado: saúde, educação, políticas sociais, etc.

Todavia, algo sobressai na forma de governar do atual chefe político do estado: um profundo ódio ao funcionalismo público estadual. São quase 07 anos sem nenhuma recomposição salarial, levando o conjunto dos trabalhadores públicos a ter seus salários confiscados pela inflação do período. O governador agiu de forma devastadora para destruir os diversos planos de cargos/salários e retirou um conjunto de direitos do funcionalismo público que não encontramos precedência na história do serviço público baiano.

O estado da Bahia, nesse momento, tem um superávit que não pode ser explicado diante da penúria salarial do funcionalismo. O orçamento estadual de 2014 para cá cresceu 42,3%, no mesmo período a arrecadação do ICMS cresceu 63,9%. No último quadrimestre, em sentido comparativo com o ano passado, a receita aumentou 9,2%. O estado deve ter um superávit de 4 bilhões em 2021. Ao lado desses dados, chama-nos atenção que a destinação de recursos para o pagamento do funcionalismo encontra-se em torno de 36,9%, bem longe do limite prudencial que é de 46,7% segundo a lei de (ir) responsabilidade fiscal. Hoje, a Bahia tem uma folga em torno de 9,8% do orçamento para pessoal e uma reserva de caixa de 4 bilhões. O que justifica tamanho descompromisso com os agentes do serviço público? Estado não é empresa privada.

No caso dos professores/as das universidades estaduais (UNEB, UESB, UEFS, UESC) o governador congelou salários, atacou o Estatuto do Magistério Superior, cortou provisoriamente salários em momentos de luta da categoria, feriu de morte a autonomia das universidades, contingencia e corta verbas das universidades, não permite progressão e promoção na carreira, intervém de forma autoritária e obscurantista nas universidades, impede concurso público e seleção emergencial. São tantas ações regressivas que não cabem no escopo desse pequeno texto.

O governo da Bahia, ora em análise, constitui-se em um aparelho do projeto neoliberal, com um perfil ideológico de característica conservadora. Cito apenas a gestão da Polícia Militar (PM) como um exemplo dessa definição ideológica de caráter conservador. A força pública na Bahia é uma das mais violentas do país (vejam as estatísticas), com episódios lamentáveis de assassinatos da população negra-pobre-periférica, a exemplo da Chacina do Cabula. Continuadamente tem tido posturas execráveis, a exemplo do aparato de segurança do estado considerar o paredão (lazer) da população negra-pobre-periférica como atividade voltada para o crime. Considero importante a preocupação com a Covid 19, e nesse sentido, cabe registrar que o governo da Bahia teve uma postura séria nesse processo, no entanto, não se pode criminalizar a cultura popular e localizar nessa atividade popular a responsabilidade pelo aumento dos homicídios na Bahia. Cabe aqui, também, um registro sobre a política penitenciária do estado e seu caráter degradante para qualquer possibilidade de ressocialização dos apenados.

Ao fim e ao cabo, o governo Rui Costa contribuiu para reafirmar o papel da autocracia burguesa em nosso estado; o governador avançou na construção de uma retrógrada base parlamentar e política; dissemina, com sua performance midiática, uma ideologia conservadora; resolveu, por princípio, retirar dos serviços públicos a gestão pública. Essa é a ordem do Estado privado que serve tão bem aos interesses da burguesia e tão mal ao conjunto da população. Até quando seremos destruídos?

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