Operação Perseus – Por que o Estado ainda insiste tanto na fracassada guerra contra as drogas?

Por Daniele Lima

Recentemente, aconteceu na cidade de Jequié, a Operação Perseus, uma operação policial que tinha como objetivo acabar com o tráfico e violência na região. Duas pessoas morreram e mais 263 foram presas em flagrante. Os moradores das periferias tiveram que se acostumar com helicópteros militares sobrevoando suas casas e com a sensação de medo e incerteza ao andar nas ruas – até porque não se sabe quando a polícia vai confundir um guarda-chuva com uma arma ou decidir que você é suspeito somente pela cor de pele.

Dizem que a operação foi bem-sucedida, então por que a população continua presenciando trocas de tiro em plena luz do dia? Por que pessoas ainda são obrigadas a abandonar suas casas por causa de confrontos entre facções?

O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo e nada muda. O tráfico continua acontecendo, a polícia segue invadindo periferias e favelas, e assim pessoas inocentes seguem morrendo e tendo suas vidas sacrificadas em nome de uma guerra fracassada. É um ciclo sem fim.

Achar que tudo isso vai ser resolvido com operações violentas é ter uma visão superficial sobre o assunto, é fechar os olhos para a realidade cruel e os verdadeiros interesses do Estado. E a realidade, é que essa guerra não é contra as drogas, é contra um grupo específico de pessoas que está sempre relacionado a criminalidade.

O relatório Pele Alvo: a cor que a polícia apaga feito pela Rede de Observatórios de Segurança em 2021, traz dados assustadores sobre a violência policial no estado. Na Bahia, de 616 pessoas mortas por interferência do Estado, 603 eram negras. Na capital, 299 pessoas foram assassinadas pela polícia, e apenas uma delas era branca. Enquanto a população preta e parda representa 76,3% da população baiana, infelizmente também representa 97,9% das mortes em ações policiais. 

Não se vê a polícia fazendo operações em bairros ricos dominados por pessoas brancas, e é nítida a diferença de tratamento midiático quando um “traficante” negro com menos de 100g de maconha é preso, para um “sargento” branco que embarca com 37kg de cocaína em um avião da FAB e continua livre.  

Existe um conceito filosófico que explica muito bem isso, a Necropolítica. Essa teoria consiste no controle e soberania do Estado sobre a população, seu poder de decisão sobre qual vida é valiosa ou não, quem merece viver e quem merece morrer. 

Na prática, nós vivemos isso todos os dias. O Estado está constantemente usando de seus aparelhos sociais para matar as vidas que considera descartável. Não é à toa que a polícia só invade favelas, e que crianças negras morram de bala perdida com tanta frequência.

Com o dinheiro que o Estado gasta com a guerra às drogas, muitas políticas públicas poderiam ser criadas, mas isso não é de interesse da burguesia, para eles é mais fácil investir no encarceramento e massacre da população negra do que investir em programas sociais que favoreçam as periferias. O Estado não tem nenhum interesse em acabar com o narcotráfico, muito pelo contrário.

Assim como aconteceu em Jequié, a imensa maioria das pessoas presas em flagrante por porte de drogas são apenas usuárias, e enquanto isso, os grandes chefes e líderes de facções continuam lucrando com o comércio ilegal e vivendo suas vidas tranquilamente, longe de toda essa barbárie.Esse é só um dos motivos que integram a discussão acerca da descriminalização e legalização das drogas. 

O mercado de drogas é lucrativo justamente por causa de sua ilegalidade. A alta demanda e falta de regularização fazem com que o preço seja caro. Com a descriminalização, este mercado seria regulado e haveria um controle maior sobre o consumo e produção das substâncias, também diminuiria a violência causada por sua proibição, além de reduzir de forma significativa, a população carcerária.

No entanto, isso poderia potencializar o aumento do cenário de dependência química, o que não é um obstáculo, mas uma questão de saúde pública – dependentes químicos não são inimigos, devem ter direito a um tratamento digno e uma reabilitação humanizada.

É nítido que esse aparelhamento repressivo e violento feito pelo Estado é falho e não diminui em nada a criminalidade no país. O narcotráfico não é a causa e sim a consequência das várias políticas desiguais impostas pelo capitalismo. Não podemos continuar compactando com esse genocídio negro e não podemos permitir que o Estado continue lucrando com a pobreza da população periférica, por isso seguiremos lutando sempre pelo fim desse sistema que é uma máquina de matar. 

Por um futuro melhor e igualitário para todos!

 

Referências:

– Rocha, Filipe de Carlo Araújo. Legalização das drogas: a descriminalização e regulamentação como forma de combate ao crime organizado. 2016. repositorio.uniceub.br, http://repositorio.uniceub.br/jspui/handle/235/9105.

– Livro: Necropolítica – Achille Mbembe

– “Pele Alvo: A Cor Que a Polícia Apaga”. CESEC, https://cesecseguranca.com.br/livro/pele-alvo-a-cor-que-a-policia-apaga.

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