Das “Últimas alternativas” à Única Escapatória: o Auxílio Emergencial como Política de Estado

Reprodução: FDR

Por Sócrates Menezes –

Das “Últimas alternativas” à Única Escapatória: o Auxílio Emergencial como Política de Estado – Depois de reafirmado o caráter temporário do Auxílio Emergencial, o Governo Bolsonaro, por meio do Ministro da Economia Paulo Guedes, indicou a possibilidade de prorrogação do benefício diante da segunda onda da pandemia de COVID-19 instaurada no Brasil. Tal afirmação se dá no momento em que o país inicia o ano de 2021 com o lamentável quadro de mais de 220 mil mortes, sob uma desastrosa administração sanitária e diante do pagamento da última parcela daquilo que foi a única renda para 67 milhões de trabalhadores brasileiros em 2020.

Para Guedes, a prorrogação do Auxílio Emergencial é uma das “últimas alternativas” diante do “amplo cardápio de medidas”. O otimismo de colocar no plural aquilo que, não admitidamente, está limitado à exclusividade singular da única escapatória, é sintomático. O fato é que a irresoluta administração das crises (sanitária, econômica, social, ambiental, etc) não pode encontrar, no estreito “cardápio” de possibilidades, alguma solução que seja estruturalmente viável. E isso não é um “privilégio” do mais-que-incompetente governo brasileiro. A prorrogação indefinida de medidas emergenciais não é um sintoma estritamente nacional. Ela revela a falência, já amplamente denunciada, de um sistema socioeconômico estruturado na impossibilidade de gerir, sequer minimamente, contradições gerais esgarçadas e concretizadas diante do contexto pandêmico, especialmente àquelas ligadas ao agravamento das condições sociais e de sobrevivência dos trabalhadores.

O debate sobre um programa estatal de renda básica ou mínima, destinado às camadas mais empobrecidas da classe trabalhadora, vem, então, ganhando força em todo mundo. Obviamente, a necessidade de tal medida é premente e ganha agora urgência, especialmente diante das profundas fissuras no quadro da miserabilidade social do mundo, que se revela estrutural e irresoluto, diante do capitalismo de barbárie em que vivemos, apesar da intencionalidade de isolá-lo como “efeitos destrutivos” específicos da pandemia de coronavírus. De liberais clássicos, liberais progressistas e até sociais-democratas empurrados para o campo da esquerda, todos estes estão agora invocados à defesa da institucionalização de um benefício permanente aos trabalhadores pobres. Mas, obviamente, uma política de Estado dessa natureza tem múltiplos significados e desafios que devem ser expostos.

Primeiro, diz respeito à natureza política. A constituição de uma política de Estado pressupõe uma objetividade finalística. Ou seja: qual é o objetivo final de uma programa estatal de renda mínima? Manter vivo trabalhadores empobrecidos pela lógica do livre mercado, poder-se-ia admitir. Mas isso seria, por si mesmo, uma contradição nos termos e só revela os limites civilizatórios de um sistema sem alternativas minimamente humanitárias.

Os significados também dizem respeito à política econômica admitida e gestada pelos governos comprometidos com a preservação do mercado. Um aporte financeiro de tamanha envergadura exigiria uma política econômica que avançasse, por exemplo, em pautas de difícil aceitação pelas classes dominantes nacionais, como a taxação significativa de grandes fortunas, de rendas e de patrimônios. Esse entrave político, considerando a coalizão de classes no Brasil, por exemplo, é quase absoluto.

Por fim, apresenta-se os limites do discurso e da filantropia burguesa. Obviamente, a necessidade de manutenção da vida, via consumo básico ou mínimo, de bilhões de trabalhadores jogados no mercado informal e no exército industrial de reserva, é emergente, imprescindível e, até, a única escapatória para o que restou de humanitário nos estreitos limites do capitalismo hodierno. Mas, uma política social efetiva, que garanta direitos básicos à população como um todo, é inconciliável às demandas de lucratividade impostas pela concorrência do mercado.

Daí que a mera prorrogação do auxílio emergencial admitido por Paulo Guedes, por exemplo, jamais virá separado de um conjunto de reformas e outras duras medidas antissociais e pró-capital. Por isso, a única forma de inserir a massa da classe trabalhadora miserabilizada no circuito do capital não será possível, senão pelo consumo. Isso nada mais reforça do que a estrutural – agora, radical e absoluta – separação entre consumo e produção. Afinal, no capitalismo, desde sempre, a questão nunca foi a capacidade produtiva do trabalho e dos meios de produção, mas a estrutural alienação entre os produtores reais (trabalhadores) e os resultados de sua produção, também a eles alienada.

Do ponto de vista do proletário, sobreviver continua sendo o primeiro e o único ato de existência. Para a classe trabalhadora, não haverá escapatória, senão a superação do círculo vicioso do capital que não mais apresenta qualquer alternativa.

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