Espaço Cultural – 60 anos do lançamento de Samba Esquema Novo de Jorge Ben Jor

Por Wenderson Ribeiro

Grandes pesquisadores da música brasileira afirmam que o período compreendido entre 1930 e meados de 1945 foi o mais rico da música brasileira e fundamental para construção do que hoje conhecemos como música nacional. Foi nesse período, conhecido como a época de ouro da música brasileira, que surgiram nomes como Orlando Silva, Noel Rosa, Dorival Caymmi, Carmen Miranda e Ary Barroso.

Entretanto, do final da década de 40 até o final da década de 50, a música brasileira passou por um hiato de carência musical. E de fato são poucos os discos e artistas que surgiram nesse período que conseguimos lembrar espontaneamente. Esse hiato termina com a chegada da década de 60 e a nova efervescência no cenário musical nacional e internacional. No Brasil, temos uma diversidade de influências e movimentos culturais surgindo, como é o caso do movimento da jovem guarda na primeira metade da década de 60, assim como a consolidação da bossa-nova com os festivais promovidos pela Rede Record. Na segunda metade da década, temos o surgimento do movimento tropicalista, a consolidação da bossa-nova e o surgimento de novos grandes artistas do samba.

Entre os diversos nomes que surgiram nesse período, sem dúvidas, o carioca Jorge Ben Jor foi um dos que mais impactaram a música brasileira da segunda metade do século XX. Em janeiro deste ano, seu álbum de estreia “Samba Esquema Novo” completou 60 anos de lançamento. Com esse álbum, o cantor carioca trouxe para o público o tipo de som diferente do que existia naquele momento, especialmente da bossa-nova que dominava. Nesse período, artistas como João Gilberto, Tom Jobim, Vinicius de Moraes e Nara Leão dominavam as paradas com canções que se tornaram clássicos da música brasileira, como “Garota de Ipanema”, “Águas de Março” e “Chega de Saudade”.

Jorge Ben Jor se diferencia de tudo que era feito até então. Embora o samba seja a base do álbum, o músico carioca incorpora elementos do jazz em suas músicas, com harmonias complexas e improvisações. Um exemplo claro da influência do jazz no álbum é a música “Mas, Que nada!” que se tornou um dos maiores sucessos do álbum. A música tem uma harmonia incomum para um samba tradicional, com acordes menores e um uso mais livre de progressão harmônica. Além disso, a música tem um solo de saxofone improvisado, que é uma marca registrada do jazz.

Outras músicas do álbum, como “Chove Chuva” e “Por Causa de Você, menina”, também apresentam elementos do jazz, como acordes mais complexos e improvisações, que dão um tom mais sofisticado e moderno ao samba tradicional. Além do jazz e do Samba, temos influências da bossa-nova, jongo e do rock nesse álbum. Essas diversas influências se combinam na criação de um som único e inovador, que se tornou um marco na história da música brasileira e influenciou muitos artistas brasileiros e internacionais. Não à toa, o próprio samba-rock foi fortemente influenciado pelo Samba Esquema Novo.

Em suas letras, podemos ver uma influência do cotidiano suburbano e da negritude, como em “Mas, que nada!” em que ele diz que:

Este samba que é misto de maracatu,

 é samba de preto velho, samba de preto tu.

  Em “A Tamba” ele canta

Desde que se foi
O nosso Rei Nagô, ô, ô…
Ninguém jamais fez samba
Ninguém jamais cantou

Nesses versos, podemos ver que o Jorge Ben Jor utiliza termos incomum até para o próprio movimento negro da época, evidenciando que nos movimentos culturais havia mais influência do movimento de negritude do que em setores organizados do movimento negro.

Com esse álbum, Jorge Ben Jor influenciou diversos movimentos e artistas subsequentes, como é o caso do grupo Mundo Livre S/A que estreia com o álbum Samba Esquema Noise (1994) nome que faz clara referência ao álbum do músico carioca. Entretanto, talvez tenha sido o rap o gênero mais influenciado por esse álbum.

No rap nacional, a influência de “Samba Esquema Novo” é notória desde referências nas letras de rap até os samples utilizados na construção dos instrumentais de vários clássicos. Um exemplo é a música “Chove Chuva” que foi sampleada para construção da música “Tá na Chuva”, dos Racionais MC’s.

Porém, o brilhante álbum do Jorge Ben Jor influenciou também diversos rappers internacionais, como é o caso do grupo Black Eyed Peas. Sérgio Mendes, cantor que já havia regravado a música “Mas, que nada!” participa da regravação da música com o grupo norte-americano e faz com que a música se tornou um grande sucesso mundial. A nova versão da música apresenta a combinação da batida do samba com o hip-hop e o R&B, e é cantada em inglês e português.

Não é à toa que esse álbum é considerado um dos melhores de todos os tempos da música brasileira, influenciou uma geração de grandes nomes da música brasileira do mangue beat ao rap, continua e continuará influenciando com o Sacundim, sacundem!

Referências

BARRADAS, F. da C. MPB – A época do ouro (1929-1945) e a Pré-Bossa (1946-1957). Akrópolis Umuarama, v. 25, n. 1, p. 69-79, jan./jun. 2017.

SANT’ANNA, Afonso Romano de. Música Popular e Moderna Poesia Brasileira. Rio de Janeiro: Vozes, 1972.

OLIVEIRA, Maria Cláudia. Bossa Nova, história, som e imagem. Rio de Janeiro: Spala, 1995.

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