EDITORIAL – Salvador no eixo da desigualdade reiterada

Reprodução: Brasil 247

Por Milton Pinheiro

Salvador no eixo da desigualdade reiterada – Salvador, a histórica cidade da Bahia, encontra-se sob um longo domínio de um modelo de gestão pública que é articulado por um grupo constituído como a terceira geração do carlismo. Trata-se de uma vertente autocrática da política na Bahia, em especial em Salvador, marcada pela lógica do clientelismo, pelo balcão de negócios locais e pelo autoritarismo tecnocrático.

ACM Neto, herdeiro mais típico do espólio do ex-governador Antônio Carlos Magalhães, construiu uma perspectiva de poder político que é operado a partir de algumas premissas: “embelezamento” do espaço público, obras de “fachadas” que não se efetivam como espaço de prestação de serviços, pois não se tornam efetivas no atendimento social. Ao lado disso, o chefe político aprofundou um discurso midiático que consegue reificar o tripé da competência/honestidade, dedicação ao trabalho e “amor” pela cidade como ação de gestão pública.

O ex-prefeito do DEM encontrou a cidade de Salvador com graves problemas de gestão, advindos da incapacidade gerencial do senhor João Henrique. Portanto, criar uma aposta comparativa para justificar a capacidade técnica do chefe político ACM Neto não é baliza para definir esse último como um baluarte da administração pública.

Dois mandatos marcados pela lógica da revitalização de praças e da orla marítima como princípio definidor do marketing pessoal do prefeito. Contudo, quando a questão é a necessidade de ampliação adequada dos serviços públicos de saúde e educação ficamos com o espaço físico construído sem o devido contingente de profissionais para atender às demandas da população carente e periférica dessa cidade, que exala desigualdade social por todos os lados: bairros sem a devida infraestrutura básica, serviços públicos restritos, periferia completamente carente de atendimento, transporte público caro e de péssima qualidade, favelas centrais entregue ao desespero social. Tudo isso com a política social pautada em “currais” políticos da estrutura clientelista organizada pelo chefe político local (as administrações regionais).

Do ponto de vista do espaço de poder, o ex-prefeito montou uma máquina para operar no governo municipal, em que cabe seu grupo mais próximo (quadros que vieram do antigo PFL), os descontentes com o governo burgo-petista de Rui Costa e as lideranças fisiológicas dos bairros.

Do seu grupo mais restrito, retirou um jovem “poste” para emplacar na última disputa eleitoral, Bruno Reis. Tudo ao modelo de liderança carismática, que precisa demonstrar força, portanto, colocando alguém na disputa, mas completamente dependente do chefe. Essa caricata ação política encontrará seu auge nesse “terceiro mandato” de ACM Neto; a prefeitura de Salvador continuará como polo aglutinador desse modelo de articulação política, só que agora na perspectiva de fazer do ex-prefeito um forte pretendente ao governo da Bahia em 2022.

Do ponto de vista da política nacional, ACM Neto é aliado do agitador fascista Jair Bolsonaro. Contudo, usa regularmente uma propaganda diversionista para informar que não é da base de apoio de Bolsonaro. Afinal, Salvador tem altos índices de rejeição ao presidente da república. Todavia, sua base parlamentar federal opera em aliança com o governo obscurantista nas mais diversas pautas, em especial naquelas que atacam os trabalhadores/as e estimulam contrarreformas para retirar direitos: são ações para remunerar, a partir do fundo público, às diversas frações da burguesia interna. Mas, é importante registrar, também, que a base parlamentar federal do governador Rui Costa tem lideranças do governo Jair Bolsonaro, a exemplo de Cláudio Cajado e José Rocha.

O povo da cidade de Salvador tem dificuldade de discernimento entre os projetos que perpassam a disputa política entre ACM Neto (DEM) e Rui Costa (PT), pois ambos operam no campo do pragmatismo do mercado da política; ambos têm fixação por obras que nem sempre atendem aos interesses mais sentidos da população; ambos alimentam o clientelismo local (lideranças de bairros e prefeitos); ambos têm o Estado como uma agência reguladora; ambos desenvolvem forte relação de negócios da política com a burguesia. Como a população de Salvador pode discernir esses projetos? Na dúvida, a população da cidade da Bahia tem escolhido o que está mais próximo dele.

A lógica da dominação neocarlista tende a saturar. Como as forças da esquerda socialista irão operar para se contrapor ao projeto neoliberal em Salvador e avançar na perspectiva dos interesses populares? Essa é a questão que deve orientar a oposição de Bruno Reis.

Salvador precisa vencer a desigualdade reiterada da lógica capitalista, reificada pela gestão do neocarlismo. Em uma palavra: a batalha é pela organização popular e por um novo projeto de poder local.

Sair da versão mobile