Sucateamento e encarecimento do transporte público em Salvador

Por Gabriel Pereira

O sistema de transporte público em Salvador representa um transtorno para a classe trabalhadora desde sempre, e é um ótimo exemplo de como a burguesia utiliza todos os meios possíveis para lucrar em cima das dificuldades do proletariado.

Com a disputa licitatória de 2015, a tarifa de ônibus passou a ter aumento anual, baseado no IPCA (Índice de Preço ao Consumidor Amplo). Na época, a tarifa estava no valor de 2,80 R$ hoje, em 2024, o valor é de 5,20 R$, sendo a tarifa mais cara entre as capitais do nordeste e umas das mais caras do Brasil.

Infelizmente o reajuste anual na tarifa não se converte em melhorias significativas no setor. Na totalidade dos bairros da cidade a frota de ônibus ainda não foi renovada, o atraso e a superlotação é um problema crônico e a classe rodoviária vive sob constante ameaça de seus direitos e precarização do trabalho pelas empresas dominantes.

O aumento na tarifa vem acompanhado do processo que vamos chamar de “integralização” do transporte urbano. Com o crescimento do Metrô e a chegada do BRT, diversas linhas de ônibus foram sendo extintas no decorrer dos anos, obrigando os usuários dos coletivos a utilizarem mais de uma condução para chegar ao seu destino final, encarecendo ainda mais o transporte urbano.

Esse processo pode até parecer benéfico aos cidadãos que possuem emprego fixo e usufruem do cartão de passagem, mas ele ignora a esmagadora maioria de autônomos e subempregados que para trafegarem pela cidade terão que desembolsar minimamente 10,40 R$, sem contar com o gasto com seus dependentes. Sendo assim, o que acontece na prática é a inibição dessas pessoas ao direito à cidade, e a transferência desses valores a empresas como Uber e 99pop, que em determinadas situações passam a ser mais em conta que o próprio transporte público.

Se por um lado a licitação de 2015 encarece a tarifa de ônibus em salvador, a falta de uma licitação é um grave problema no sistema de transporte metropolitano. A tarifa metropolitana é mais cara que a tarifa da capital, não possui padronização visual em suas conduções e o maquinário é extremamente sulcateado, geralmente é reutilizado os ônibus descartados pelas empresas de Salvador, chegando a operar com maquinas com mais de 15 anos de uso. O atraso nas linhas é constante, e por ter uma frota bastante reduzida, menos de 90 ônibus rodando, qualquer atraso representa uma grande lotação nas conduções e atraso de mais de 2 horas para chegada do usuário ao seu destino.

A superlotação, que não é só um problema da linha metropolitana, é mais que um desrespeito à população que utiliza os coletivos, representa também um risco a saúde de idosos que podem vir a passar mal pelo abafamento e longos período de tempo de pé, seja na espera ou dentro das conduções, além de dificultar o acesso para cadeirantes, autistas e gestantes que venham necessitar utilizar os coletivos.

A superlotação nos transportes públicos é mais uma escolha dos administradores que uma consequência da grande massa que o utiliza. Salvador, desde a pandemia, roda com sua frota de ônibus reduzida. Essa escolha fez com que os coletivos viessem a ser um grande roteador da Covid-19 entre a classe trabalhadora.

A frota reduzida é utilizada especialmente nos finais de semana, limitando ainda mais o pouco tempo de lazer que o trabalhador tem em seu dia a dia. É simplesmente mais lucrativo reduzir a frota e segurar a condução na garagem o máximo possível para recolher o máximo de usuários de uma só vez do que colocar 100% da frota na rua em horários bem definidos em benefício da população.

Outro agravante na mobilidade urbana da cidade foi o extermínio do trem da suburbana por parte do governo do estado, sendo substituído pelo VLT, um transporte sobre rodas ultrapassado e que irá golpear o bolso do trabalhador suburbano. O trem, além de ter sido patrimônio histórico da cidade, fazia o trajeto no custo simbólico de 0,50 centavos. Hoje, os moradores têm o ônibus como única opção de mobilidade no valor de 5,20R$. O VLT, projeto que a anos se estende e que está longe de ser concluído, representa um custo de 5,2 bilhões aos cofres do estado e ainda não se sabe qual será o valor de sua tarifa, mas podemos afirmar que representará um grande assalto ao bolso dos moradores da suburbana.

A extinção do trem da suburbana está única e exclusivamente ligada à prioridade que o estado burguês dá ao lucro de seus cúmplices em detrimento da qualidade de vida da classe trabalhadora, pois compensou mais a burguesia deixar o patrimônio histórico da cidade definhar em ferrugem até seu último dia de funcionamento e vender o monopólio desse setor a alguma empresa aliada, que lucrará milhares de reais entregando um serviço caro a uma população que em sua maioria vive no subemprego e não poderá arcar com o custo tranquilamente.
Apesar dos inúmeros problemas listados, a mobilização popular em prol de uma reformulação do sistema de transportes e pelo passe livre é quase nula e representa um grande desafio aos movimentos de esquerda da cidade.

Questionado sobre a possibilidade do Passe Livre, o secretário municipal de mobilidade urbana reconheceu o crescimento do debate pelo país, mas afirma ser uma ideia utópica a ser aplicada em uma grande cidade como Salvador. E seguindo a linha de raciocínio do prefeito Bruno Reis, solicita verba da federação para que o sistema caminhe minimamente neste sentido.

Apesar de alegar falta de verba para melhorar o serviço de transportes, a prefeitura cedeu às empresas do setor um incentivo fiscal de 202 milhões de reais em novembro de 2023, junto com o reajuste para o valor atual da tarifa (5,20) e mesmo assim, não se vê melhora no funcionamento do setor.

É necessário que se forme uma unidade de ação robusta em torno dessa pauta e se formule um calendário de lutas que busque atrapalhar significativamente o funcionamento da cidade em pontos estratégicos e que consiga atrair não só o Movimento Estudantil mas também os trabalhadores da cidade de modo geral.

A mobilização em torno dessa pauta diz respeito a todos e todas que sentem na pele a dificuldade de lidar com os custos do transporte e a humilhação de passar horas de pé e sufocado pela superlotação, para que o direito ao transporte deixe de ser mercadoria nas mãos de empresários e passe a ser a garantia do lazer e do ir e vir do cidadão a luta tem que ser unificada. Estudante e trabalhador, empregado e desempregado, todos às ruas contra o sucateamento e o domínio empresarial nos transportes!

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